Em plena ditadura militar Cildo Meireles aplicava decalques em silk-screen em garrafas retornáveis de Coca Cola.
Elas voltavam à circulação uma mensagem que questionava o regime ou mesmo com instruções para fazer um coquetel molotov.
Nas garrafas vazias as mensagens ficavam praticamente invisíveis. Quando as garrafas voltavam à circulação, traziam as mensagens bem visíveis para os consumidores do produto.
Não sei se o conceito – Inserções em Circuitos Ideológicos era o seu nome – foi executado de fato – e em larga escala -, mas sua mera existência já denota a transgressão e a trolagem de alto nível que a boa arte deve ter.
Cildo Meireles deu continuidade à trolagem de Duchamp. Em vez de simplesmente tomar um objeto produzido industrialmente (o mais célebre exemplo: A Fonte) e chamá-lo de arte ao colocá-lo no museu, num salão ou em uma galeria, ele interviu no objeto e recolocou-o em seu circuito industrial, sendo um verdadeiro hacker antes mesmo de alguém sonhar com esse termo.
Bem que eu gostaria de saber a postura da multinacional frente ao fato de por um lado estar ligada a um trabalho de um artista tão importante e, por outro, a uma atividade potencialmente violenta (não estou analisando quem era o mocinho e o bandido na época, mas as consequências).
Outro exemplo da arte de Meireles:
Depois de o regime militar ter matado o jornalista Vladimir Herzog, Meireles carimbou notas de 1 cruzeiro que circulavam levando a pergunta que todos queriam fazer mas que por conta, da pouca liberdade de expressão, ninguém podia: “Quem matou Herzog?”.
Na ocasião, a ditadura militar garantiu que o jornalista havia cometido suicídio divulgando uma foto em que a vítima aparecia enforcada.
Meireles, hacker e artista, sabia: perguntar não ofende.
Postado por Tia Jana
Retirado de: Livros & afins
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