Prof. Edvaldo Cavalcante
Vi, por esses dias, o vídeo (que capturei no maravilhoso You Tube) do programa “30 Anos Incríveis”, especial sobre Clarice Lispector. Nunca havia visto uma imagem dela, o falar, o gestual. Conhecia apenas pelos contos e pelos livros que li. Clarice é cult não só pela forma de escrever. Percebi, no vídeo, que ela cultivava uma personalidade que suscitava essa classificação. Em pouco mais de 30 minutos de entrevista, ela fumou muito e não deu um sorriso. Recusou-se a responder algumas perguntas com a alegação de que as respostas eram segredo. No começo da entrevista me surpreendi com o sotaque dela. Uma espécie de francês misturado com nordestino. Sim, nordestino, ela viveu parte da sua juventude no Recife. O mistério, acerca da forma de falar da grande escritora, foi desvendado pela sua biógrafa, Nádia Batella Gotlib. Segundo ela, não era nenhum sotaque, Clarice tinha a língua presa e nunca quis operar porque tinha pavor de cirurgias, achava que sentiria dor. Conservou o “defeito” que, ao meu ver, lhe conferia um charme ainda maior. Essa não é a única curiosidade envolvendo Clarice Lispector. Ela foi voluntária na Segunda Guerra Mundial servindo com enfermeira na Força Expedicionária Brasileira. O New York Times, em matéria do crítico e tradutor Gregory Rabassa, classificou a escritora como “a Kafka da literatura latino-americana”.
Clarice dizia que vivia várias vidas. Por quê? Ela explica: “quando não estou escrevendo eu estou morta. Agora mesmo eu estou morta. Quando voltar a inspiração e eu voltar a escrever, renascerei”. O amor de Clarice pelo seu ofício, de escritora, pode ser percebido no diálogo, entre ela e o jornalista José Castello, que reproduzo a seguir:
J.C. — Por que você escreve?
C.L. — Vou lhe responder com outra pergunta: — Por que você bebe água?
J.C. — Por que bebo água? Porque tenho sede.
C.L. — Quer dizer que você bebe água para não morrer. Pois eu também: escrevo para me manter viva.
Confesso que li pouco Clarice, apenas dois livros. O primeiro, “Água Viva”, li na década de 80 quando cursava o ensino médio. Não foi uma leitura fácil. A busca pela liberdade e todo aquele jogo de palavras me custaram uma nota baixa em literatura. Depois li “A Hora da Estrela”. Desse livro eu gosto bastante. Acho que Macabéa era a própria Clarice. A construção desse personagem deve-se muito ao tempo em que ela viveu no Recife.
Escrevi há algum tempo que a internet me distanciou um pouco dos livros. Estou tentando sanar esse problema mergulhando no universo (misterioso) de Clarice Lispector. Vou ler “Laços de Família” para renascer. Não se vive sem livros, percebo agora. Segue abaixo, a primeira parte da entrevista que cito no post. Lembrando que o vídeo completo, dividido em cinco partes, está disponível no You Tube. Você pode encontrar também as partes reunidas aqui.
1 comentários:
Maravilhoso!
Clarice, sem dúvidas, vive pela escrita. Dá orgulho em saber que Recife contribuiu pra sua formação de pessoa e, concomitantemente, escritora. Clarice é lição de vida cotidiana, sem mais palavras.
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